2010/10/23

A SANTIDADE NO TEMPO

Não existem em mim certezas, mas alguns conceitos estão arraigados.
Tempo é o que nos foi ofertado ao nascermos, o restante são decisões que vão preenche-lo.
Ao findar a existência, ela terá sido o resultado daquilo que escolhemos para preencher essa oferta.

“Há um reino do tempo em que a meta não é ter, mas ser, não possuir, mas dar, não controlar, mas partilhar; não submeter, mas estar de acordo.
A vida vai mal quando o controle do espaço, a aquisição de coisas do espaço, torna-se nossa única preocupação”.
“Uma das mais notáveis palavras na Bíblia é cadosch, santo, uma palavra que, mais do que qualquer outra, é representativa do mistério e majestade do divino.
Pois bem, qual teria sido o primeiro objeto santo na história do mundo?
Teria sido uma montanha? Teria sido um altar?
De fato, é uma ocasião única aquela em que a notável palavra cadosch é usada pela primeira vez: no livro do Gênese, ao final da história da criação.
Quão extremamente significativo é o fato de ela ser aplicada ao tempo: “E Deus abençoou o sétimo dia e fê-lo santo”!
Não há referência a nenhum objeto no espaço que teria sido dotado com a qualidade de santidade”.
“Quando a história começou havia somente uma santidade no mundo, a santidade no tempo”.
                                                  Abraham Joshua Heschel

2010/10/03

AUTO-RESPONSABILIDADE

Está institucionalizado que toda a política é feita por pessoas mal intencionadas e de caráter nefasto.
Eles são a escória, resíduo do que deveria haver em uma sociedade.
Mas sendo o político nada mais do que o representante da sociedade, não é ele a imagem da própria sociedade mundial?
O Homem é um Ser político – como sacou Aristóteles, já no despertar da filosofia –, fazemos política toda hora.
Que tipo de político você é no seu dia a dia?
Você é melhor político dos que estão no legislativo, no executivo ou no judiciário?
Que tipo de vantagem obtém, levando em conta o nível de poder seu dentro na sociedade?
Como desnuda Maquiavel, a sobrevivência do Status Quo (in statu quo res erant ante bellum) sobrepõe a Ética.
Representantes públicos, empresários, empregadores, burocratas, chefes, professores, pais, irmãos mais velhos... – todos nós temos ascedência sobre alguém.
Há sociedades com um nível de corrupção quase nulo e citando algumas por ordem- Nova Zelândia, Dinamarca, Cingapura, Suécia, Suíça e Finlândia – observo que todas têm sua economia e política calcadas em programas de bem-estar-social (Singapura é o único dos tigres asiáticos a não utilizar mão de obra barata) e não baseadas na economia de consumo.
 Coincidência?
Na eleição de hoje você vai eleger alguém que vai fazer política representativa.... mas, e a partir de amanhã, que tipo de política você vai praticar?

Rui Barbosa por Rolando Boldrin

2010/09/30

“ NAVIGARE NECESSE; VIVERE NON EST NECESSE" - (Plutarco)


O navio "Fernando Pessoa" deixando o Porto,
pois existir requer partir
e partir é da natureza lusa...
saudade uma exclusividade.

Não existem voltas, só idas.

Em uma Terra que, por hábito, muito se olha para trás,
satisfaço minha natureza e parto olhando para frente
- com a inevitável saudade já instalada.
(Que dias há que n'alma me tem posto um não sei quê, que nasce não sei onde, vem não sei como, e dói não sei porquê - Camões) .

"barco, meu coração não agüenta
Tanta tormenta, alegria
Meu coração não contenta
O dia, o marco, meu coração
O porto, não

Navegar é preciso
Viver não é preciso

O barco, noite no céu tão bonito
Sorriso solto, perdido
Horizonte, madrugada
O riso, o arco da madrugada
O porto, nada

Navegar é preciso
Viver não é preciso

O barco, o automóvel brilhante
O trilho solto, o barulho
Do meu dente em tua veia
O sangue, o charco, barulho lento
O porto, silêncio

Navegar é preciso
Viver não é preciso"
                                             - Caetano Velloso

2010/09/27

" DOBRADA À MODA DO PORTO"

Dando seqüencia ao redescobrimento de Portugal, segue o uso do poeta para transcrever o que há em meu coração:

Um dia, num restaurante, fora do espaço e do tempo,
Serviram-me o amor como dobrada fria.
Disse delicadamente ao missionário da cozinha
Que a preferia quente,
Que a dobrada (e era à moda do Porto) nunca se come fria.

Impacientaram-se comigo.
Nunca se pode ter razão, nem num restaurante.
Não comi, não pedi outra coisa, paguei a conta,
E vim passear para toda a rua.

Quem sabe o que isto quer dizer?
Eu não sei, e foi comigo ...

(Sei muito bem que na infância de toda a gente houve um jardim,
Particular ou público, ou do vizinho.
Sei muito bem que brincarmos era o dono dele.
E que a tristeza é de hoje).

 Sei isso muitas vezes,
Mas, se eu pedi amor, porque é que me trouxeram
Dobrada à moda do Porto fria?
Não é prato que se possa comer frio,
Mas trouxeram-mo frio.
Não me queixei, mas estava frio,
Nunca se pode comer frio, mas veio frio.
                                                            Alvaro de Campos (F.P.)

2010/09/23

"PARA VIAJAR BASTA EXISTIR”

Eu existo e estou a partir,
a partir deste castelo para alem mar.
Eu existo e estou a partir,
embriagado por Fernando Pessoa e seus múltiplos.
Eu existo e estou a partir,
desancorado à caminho do Porto...
que já foi de partida para a gênese deste gajo.

Grandes são os desertos, e tudo é deserto.
Não são algumas toneladas de pedras ou tijolos ao alto
Que disfarçam o solo, o tal solo que é tudo.
Grandes são os desertos e as almas desertas e grandes —
Desertas porque não passa por elas senão elas mesmas,
Grandes porque de ali se vê tudo, e tudo morreu.

Grandes são os desertos, minha alma!
Grandes são os desertos.

Não tirei bilhete para a vida,
Errei a porta do sentimento,
Não houve vontade ou ocasião que eu não perdesse.
Hoje não me resta, em vésperas de viagem,
Com a mala aberta esperando a arrumação adiada,
Sentado na cadeira em companhia com as camisas que não cabem,
Hoje não me resta (à parte o incómodo de estar assim sentado)
Senão saber isto:
Grandes são os desertos, e tudo é deserto.
Grande é a vida, e não vale a pena haver vida.

Arrumo melhor a mala com os olhos de pensar em arrumar
Que com arrumação das mãos factícias (e creio que digo bem).
Acendo o cigarro para adiar a viagem,
Para adiar todas as viagens.
Para adiar o universo inteiro.

Volta amanhã, realidade!
Basta por hoje, gentes!
Adia-te, presente absoluto!
Mais vale não ser que ser assim.

Comprem chocolates à criança a quem sucedi por erro.
E tirem a tabuleta porque amanhã é infinito.

Mas tenho que arrumar a mala,
Tenho por força que arrumar a mala,
A mala.
Não posso levar as camisas na hipótese e a mala na razão.
Sim, toda a vida tenho tido que arrumar a mala.
Mas também, toda a vida, tenho ficado sentado sobre o canto das camisas empilhadas,
A ruminar, como um boi que não chegou a Ápis, destino.

Tenho que arrumar a mala de ser.
Tenho que existir a arrumar malas.
A cinza do cigarro cai sobre a camisa de cima do monte.
Olho para o lado, verifico que estou a dormir.
Sei só que tenho que arrumar a mala,
E que os desertos são grandes e tudo é deserto,
E qualquer parábola a respeito disto, mas dessa é que já me esqueci.

Ergo-me de repente todos os Césares.
Vou definitivamente arrumar a mala.
Arre, hei-de arrumá-la e fechá-la;
Hei-de vê-la levar de aqui,
Hei-de existir independentemente dela.

Grandes são os desertos e tudo é deserto,
Salvo erro, naturalmente.
Pobre da alma humana com oásis só no deserto ao lado!

Mais vale arrumar a mala.
                                                            Alvaro de Campos (F.P.)

2010/09/03

A FADIGA RESULTANTE DO EXISTIR

Então ele olhou para Deus (manifestado, ali, naquela figura no espelho) e, largando-se na fadiga resultante do existir, confidenciou: “Sinto muito, não deu certo”.
Eu acredito na reencarnação - novo assunto midiático – não numa maneira religiosa, mas sim como algo que fornece sentido.
Isso me dá um alento enorme, pois, sendo assim, não há urgência da perfeição imediata, da existência assertiva plena.
É astuto viver cada existência de forma mais assertiva que a anterior – evoluir -, porem, a existência é curta, extremamente curta para que a desperdicemos.
Há de se ter coragem e se auto olhar com a visão límpida - sem o embaço dos valores doutros - e analisar o Ser que se é.
Na “igreja de todos os bêbados” ** nossos piores odores são conhecidos só por nós, nossos podres interiores são segredos apenas a nós confiados, aos outros é civilizado expor o nosso melhor.
O que dá sentido à vida é ela ter um sentido.
Na medicina há uma doença denominada LER (Lesão por Esforço Repetitivo), que invalida as pessoas para a vida profissional.
A sociedade moderna está, sem ninguém se dar conta, fazendo-nos adquirir outro tipo de LER: a “Lesão por Existência Repetitiva”, que nos invalida para uma vida que valha a pena ser vivida, nos oferece uma existência sem sentido.
Citando Anah Zohar: "Somos dotados de existência temporária e de propósitos fúteis".
               ** "O banheiro é a igreja de todos os bêbados" - Cazuza

O que há em mim é sobretudo cansaço
Não disto nem daquilo,
Nem sequer de tudo ou de nada
Cansaço assim mesmo, ele mesmo,
Cansaço.

A subtileza das sensações inúteis,
As paixões violentas por coisa nenhuma,
Os amores intensos por o suposto alguém.
Essas coisas todas.
Essas e o que faz falta nelas eternamente.
Tudo isso faz um cansaço,
Este cansaço,
Cansaço.

Há sem dúvida quem ame o infinito,
Há sem dúvida quem deseje o impossível,
Há sem dúvida quem não queira nada -
Três tipos de idealistas, e eu nenhum deles:
Porque eu amo infinitamente o finito,
Porque eu desejo impossivelmente o possível,
Porque eu quero tudo, ou um pouco mais, se puder ser,
Ou até se não puder ser…

E o resultado?
Para eles a vida vivida ou sonhada,
Para eles o sonho sonhado ou vivido,
Para eles a média entre tudo e nada, isto é, isto…
Para mim só um grande, um profundo,
E, ah com que felicidade infecundo, cansaço,
Um supremíssimo cansaço.
Íssimo, íssimo. íssimo, Cansaço…

Alvaro de Campos (F.P.)

2010/07/15

"Não se preocupe em entender, viver ultrapassa qualquer entendimento." C.Lispector

A vida te passa por entre os dedos.
Dias preenchidos por problemas,
vivência de constantes arrependimentos.

A estação está mudando,
e a roupa tirada do armário é mesma.













“... nossa finalidade não é a mesma nesta terra,
Amar e seguir o caminho?
...O tempo é um oceano, mas ele termina.
Você pode não me ver amanhã”     Bob Dylan

2010/06/18

“O mundo está mais cego, mais burro”

Há alguns anos, Saramago em sua obra, ou melhor, como preferiu definir, em seu ensaio, expôs uma epidemia de cegueira que atinge toda a humanidade.
Mostrou quão frágil estão os valores sociais, pois onde ninguém vê, teoricamente nada aparece – valores que não mais existem, por que não mais podem ser vistos.

Descreveu as estatuas de olhos vendados na catedral em Lisboa bradando: “se os céus não vêem, que ninguém veja”.
O próprio autor já citou Dostoievski : “Se Deus não existe, então tudo é permitido”.

Um paradoxo acompanhou a vida de Saramago: ateu, muito falou de Deus e a sociedade, dependente da fé, muito mais se inquietou sobre aquilo que ele não acreditava (Deus) do que daquilo que ele cresse. 
Em sua ultima obra “Caim”, Saramago fala do personagem, de Deus (Jeová – Deus bíblico) e da Humanidade.
Caim é o Eu caminhando pelo mundo com o peso de Deus e a Humanidade é o Outro.

Foi-se Saramago, e como disse Fernando Meirelles “O mundo está mais cego, mais burro”.
                           
    "somos contos de contos contando contos, nada"
                                                                               Saramago

2010/06/03

“O homem é o único animal que carrega um cadáver por toda sua existência"; “Eu rezo para ter fé”.

O Homem é o único animal consciente da sua finitude, consciente da sua existência e, portanto, responsável por ela.
Tenho o Existencialismo como o código filosófico escolhido a seguir, o qual destaca o individual, a responsabilidade e a subjetividade do ser humano.
O existencialismo considera cada homem como um ser único e mestre dos seus atos e do seu destino.
Porem não declaro “o Homem está abandonado” abdicando da possível existência de Deus, apenas digo que o Homem está por conta própria - (“The dream is over, what can I say?”).

No livro “Por que Deus não vai embora?” de Andrew Newberg e Eugene D'aquili há a questão “Deus criou o cérebro ou o cérebro criou Deus?”

Na nossa formação intelectual Marx disse que se você tem fé, você é um ser manipulado a serviço do sistema produtivo.
Depois Nietzsche declara que se você tem fé, você é um ser comum incapacitado em se tornar um alem-do-homem.
Ai Freud explica que por você não conseguir conviver com a decepção com seus pais transfere tudo isso ao Monoteísmo, que para ele é reconhecer a imagem de um pai sob a imagem de Deus.

Neste mundo pós Iluminismo, para um pensador é mais elegante a idéia de neurônio do que a de Deus.

Mas “eu rezo para ter fé” e talvez um dia eu consiga tirar um pouco do peso existencial dos ombros e transferir expectativas e responsabilidades à alguma Divindade.
A vida nos leva diariamente ao desespero, “o homem é um ratinho com fome” e é compreensível a necessidade da fé, da esperança, mas se você ama Jesus ou Allah porque tem um bom emprego, isso não é fé, é troca.
A grande fé é a de quem não quer nada em troca, ao invés de pedir, agradece.
O que chamam de fé é quase sempre feito com um olhar para o futuro e isso não é fé, é expectativa (mas com o resultado vindo doutro).

Você não pediu para nascer, você lutou para nascer!
Agora a vida vive você, não somos dono dela, ela pode nos extinguir - ela continua, quem se extingue somos nós, não ela.
Enquanto isso carreguemos o cadáver.
                        
"Surgiu-me uma luz: que Zaratustra não fale ao povo, mas a companheiros! Zaratustra não deve tornar-se pastor e cão de um rebanho! Atrair muitos para longe do rebanho... foi para isso que eu vim” Nietzsche

2010/04/16

Inteligência Humana

Não há limite para o alcance da inteligência do Homem.

Obama anuncia plano de enviar homem a Marte em meados da década de 2030.

Finalmente sairemos deste Alem-Édem, este pedaço limitado do Universo cedido pelo criador, e começaremos a tomar posse daquilo que é direito daqueles que detém a dádiva da sabedoria.
Bendita seja a inteligência humana.











O Homem também viabilizou um acelerador de partículas e recriou uma simulação do Big Bang.

Poderemos, enfim, desvendar a origem das estrelas e dos planetas e o que exatamente é a matéria escura.

A probabilidade de se conseguir o choque dos 2 feixes de prótons era a mesma de se colocar uma rolha em cada lado do oceano e fazê-las colidir.









Bendita seja a inteligência humana.

"Em algum remoto rincão do universo cintilante que se derrama em um sem-número de sistemas solares, havia uma vez um astro, onde animais inteligentes inventaram o conhecimento. Foi o minuto mais soberbo e mais mentiroso da ‘história universal’: mas também foi somente um minuto. Passados poucos fôlegos da natureza congelou-se o astro, e os animais inteligentes tiveram de morrer. – Assim poderia alguém inventar uma fábula e nem por isso teria ilustrado suficientemente quão lamentável, quão fantasmagórico e fugaz, quão sem finalidade e gratuito fica o intelecto humano dentro da natureza. Houve eternidades em que ele não estava; quando de novo ele tiver passado, nada terá acontecido. Pois não há para aquele intelecto nenhuma missão mais vasta que conduzisse além da vida humana. Ao contrário, ele é humano, e somente seu possuidor e genitor o toma tão pateticamente, como se os gonzos do mundo girassem nele. Mas se pudéssemos entender-nos com a mosca, perceberíamos então que também ela bóia no ar com esse páthos e sente em si o centro voante deste mundo. Não há nada tão desprezível e mesquinho na natureza que, com um pequeno sopro daquela força do conhecimento, não transbordasse logo um odre; e como todo transportador de carga quer ter seu admirador, mesmo o mais orgulhoso dos homens, o filósofo, pensa ver por todos os lados os olhos do universo telescopicamente em mira sobre seu agir e pensar." Nietzsche

2010/03/02

"Uma rede lançada sobre a eternidade"

Hoje a união dos meus pais faz 53 anos.
Há 53 anos eles lançaram uma rede sobre a eternidade.


Nos tempos atuais o “O tempo da vida não acompanha a velocidade dos sonhos” e as redes lançadas dos novos relacionamentos quase nada alcançam.


Que um agradeça ao outro.
Que um eleve o outro.
Que Deus abençoe aos dois

Envelheça ao meu lado
O melhor ainda esta por vir
Quando a nossa hora chegar
Nós seremos um


Deus abençoe nosso amor
Deus abençoe nosso amor

Envelheça ao meu lado
Dois galhos de uma mesma árvore
Olhe para o pôr do sol
Quando o dia se acabar

Deus abençoes nosso amor
Deus abençoe nosso amor

Passando nossas vidas juntos
Marido e mulher juntos
Mundo sem fim
Mundo sem fim

Envelheça ao meu lado
O que quer que o destino decida
Nós venceremos
Por que nosso amor é verdadeiro

Deus abençoe nosso amor
Deus abençoe nosso amor




Grow Old With Me - J.Lennon

2010/02/28

Simpatia pelo Mestre - "manuscritos não ardem"

Sábado passado veio numa conversa “despretensiosa” o tema da existência de entidades que regulam o bem e o mal neste plano – ou seja, se há os chamados na nossa cultura Deus e o Diabo travando uma batalha pela conquista das nossas almas.

Num certo momento da conversa foram lembrados alguns fatos/mitos existentes na mídia que remetem aos chamados contratos (venda da alma) com o demo e das conseqüências/cobranças advindas deles.

Um fato emblemático é o ocorrido em 1969 em Altamont onde durante um show dos Rolling Stones um jovem foi assassinado pelos Hell´s Angels. Esse fato seria visto como uma simples tragédia (e na verdade como contraponto ao Woodstock – desvendando que na verdade não havia nada de paz e amor sob o céu), se não fosse o fato de que no momento da morte a banda tocava a maravilhosa música “Sympathy for the devil” (Simpatia pelo Diabo).

Chegamos ao ponto.
Essa música foi inspirada na obra russa “The Master and The Margarita” de Mikhail Bulgarov, um misto de realidade e fantasia, romance, comédia de costumes, crítica social e política onde se acompanha as aventuras de Lucifer e seu séquito bizarro pela Moscou dos anos 30.

Outras obras usam esse imaginário de intervenções sobre os humanos para lançarem luz (Lúcifer???) sobre objetos de indagação dos autores.

O Fausto de Goethe é “nosso mundo sob o olhar do nosso pequeno deus, um deus menor porque está em evolução, um homem de um deus maior”, no dizer de Fernando Pessoa.
A Bíblia registra as tentações que Jesus enfrentou e venceu, nos evangelhos de Mateus 4:1-11, Marcos 1:12 e 13 e Lucas 4:1-13.
Já Helena de Homero é lida por muitos como personificação e instrumento de enfraquecimento dos heróis.
Na obra de Bulgarov podemos encontrar tais referencias... Fausto e Helena.
Salman Rushdie, por sua vez, já declarou ter usado "O Mestre e Margarida" como modelo para seus "Versos Satânicos", que lhe renderam uma condenação a morte por parte dos islâmicos.

O Mestre do título nada mais é do que um alterego do autor.
Bulgákov se vê às voltas com a censura severa do regime, por conta de um romance sobre Pôncio Pilatos (a música "Pilates", do Pearl Jam, vem daí). É colocado num asilo para loucos, não sem antes ter queimado boa parte de seus escritos. A obra descreve o encontro do famoso procurador romano com Jesus de Nazaré, criando um curioso contraponto entre a Jerusalém em que cristãos eram cruelmente crucificados e Moscou do seu tempo.

“O Mestre...” foi escrito em segredo, nas sombras do período mais violento da repressão de Stálin. Num momento de paranóia, chegou a queimar uma primeira versão na lareira. A situação de medo e delírio acabou transportada para o livro, num lance claramente autobiográfico, que gerou sua frase mais famosa, dita pelo diabo em pessoa: "manuscritos não ardem".

Em um momento do livro, Margarida preside um baile faustuoso para os condenados ao Inferno. A cena, inspirou a canção "Love and Destroy", do Franz Ferdinand. Tim Burton faria um filme sensacional com ela - com todo o livro, aliás. Já Polanski escreveu sobre e nunca foi filmou. O velho Roman chegou a dizer que é a melhor coisa que ele jamais realizou.
Eu Nasci há dez mil anos atrás (Paulo Coelho e Raul Seixas) foi baseada na música homônima (I Was Born Abouth Ten Thousand Years) do folclore americano que Elvis Presley gravou, que contam a história de um viajante no espaço e no tempo, visitando grandes momentos da história da humanidade.
Esta é mesma formula que os Rolling Stones utilizaram em Sympathy for the Devil, na qual diz em um de seus trechos: “eu estive por aí durante longos e longos anos, roubando a alma e a fé dos homens. Eu estava por perto quando Jesus teve o seu momento de dúvida e de dor..” e onde Raul canta ”... eu vi Cristo ser crucificado, o amor nascer e ser assassinado...”.

Não existem obras satânicas... o bem e o mal estão dentro de nós, fazem parte de nós, nenhuma obra é desculpa para start de qualquer ação.

2010/02/09

O filosofiar do rei

“Há muito me perdi entre mil filosofias
Virei homem calado e até desconfiado
Procuro andar direito e ter os pés no chão
Mas certas coisas sempre me chamam atenção.....
Que culpa tenho eu me diga amigo meu
Será que tudo que eu gosto
É ilegal é imoral ou engorda?”

Estou na minha fase vinil, 33 rotações!
Sair um pouco da caverna, dos diálogos solitários com os livros, da racionalidade e me permitir à cinestesia ouvindo o rei Roberto Carlos.
Ir ao show do Cauby no Brahma - tudo de bom.

Simplificar a vida, desintelectualizá-la.
Simplificar as respostas para ela.

Dezenas de livros e a melhor sacada sobre as melhores coisas numa vida foi me dada pelo Roberto:
"1ª coisa é o sexo com amor,
2ª coisa é o sexo,
3ª coisa é o sorvete".
A sabedoria da resposta não está nas escolhas, é claro, mas sim no descomprometimento e na sinceridade que ela passou.
Que cada um a responda para si.
A vida é simples e prazerosa.
Que seja Ilegal, imoral ou engordante .
“E que tudo mais vá para o inferno”.

2010/01/09

Conatus e os afetos.

O real nem sempre combina com a vida em seu cotidiano.
Estamos acostumados ao conforto de uma certa crença na permanência. Vivemos em nome de um eu definido para nós e para os outros . Buscamos encontrar o já conhecido.
Esperança do previsível.
Impotência da alma.
Somos muito mais “deixar de ser” do que “ser”.
O diferencial está na nossa essência. Espinosa deu a ela o nome de conatus. Trata-se da potência de vida ou da potência de agir, ou seja, do tesão pela vida.
Através do conatus enxergamos o esgotamento de um modo de viver.
Através do conatus agimos e ressignificamos o outro.
Só há afetos. Só os desejos atualizam.
Como responsabilizar ou punir alguém por um ato praticado se levarmos a sério que o agente já não é mais. Que o afeto já se perdeu no tempo.
“Só há afetos. Só os desejos atualizam. Em tempo real, só as potências” Nietzsche
Quem nos é caro fica incrustado na nossa pele para sempre, permanece tatuado em nós, porem os afetos estão em nós escritos à caneta... não sendo garantia de infinidade.
Coragem se faz necessária para uma investigação sobre a vida que vale a pena ser vivida.
Mais vale uma vida verdadeira no Alasca do que se curvar à todas as felicidades instantâneas que a Paulista oferece.
Somos muito mais ‘deixar de ser’ do que ‘ser’.
Passemos a ser.
Fontes:
Clovis de Barros Filho
Felipe Lopes
Espinosa
Sponville
Autora da foto: Malu Aguiar

2010/01/01

EMPATIA - Começando o ano discorrendo sobre o Outro.

"O inferno é o outro” é uma frase de Sartre que se explica com "O ser Para-si só é Para-si através do outro" pois só através dos olhos do outro é que alguém consegue se ver como parte do mundo.
O inferno vem do fato que, embora seja o outro que impossibilite a concretização de um projeto puro meu, interferindo sempre no meu caminho, é fato que sem ele o próprio projeto fundamental não faria sentido.

A criação do novo humano – o além-do-homem de Nietzsche – vem da vontade e iniciativa de empatizarmos com o outro, de entedermos o outro.

A necessidade de expressar esse sentimento veio depois que vi um lance do campeonato de futebol portugues em que o goleiro após marcar infortuitamente um gol se mostra constrangido e até se desculpa com o outro goleiro.



É o Um se empatizando com o Outro.
Sabedor da dor causada e sabedor também que o feito nunca volta, resta apenas entender a dor do outro.

Rui Sacramento é o nome desse homem.
Imagem: "Empatia" de Nela Vicente