2008/12/26

Qual a cor deve ter o próximo gato? Pois o futuro ao morto não interessa.

Não agüento mais ouvir/ler sobre Natal/Papai Noel já engatado no assunto crise.... e olha que a imprensa empregou seu papel de “formadora de opinião” com maestria pois nunca vi tanta gente de uma hora para outra começar a discorrer sobre economia.
E lá vem os repórteres nos shoppings ou na 25 mostrando um oceano de pretensos consumidores a olhar produtos enquanto algum outro é interrogado.
Pauta é discorrer sobre a causa e o efeito nos resultados do comércio, sempre com o veículo de comunicação falando sobre o efeito e o entrevistado respondendo – sem pestanejar - qual seria causa responsável.


Efeito: Consumidor redobra cautela com as compras de natal.
Causa: A crise que veio lá de fora.

Efeito: Aumento do preço do panetone.
Causa: A crise que veio lá de fora.

Efeito: Aumento do preço das lembrancinhas.
Causa: A crise que veio lá de fora.


Efeito: Aumento dos aparelhos eletrônicos.
Causa: A crise que veio lá de fora.


As pessoas estão apavoradas olhando para uma realidade que ainda não é delas e que não inevitavelmente será.
Está havendo uma onda muito perigosa de pessimismo.
O medo está no ar.
O medo é um veneno.
O medo nos paralisa.

Cada um lê o que quer, busca a sua sintonia. Eu dentro de tantas matérias pessimistas pinço três (tem mais, acreditem) que, não catastróficas, estão de acordo com meus pensamentos:

**Para o ex-ministro Antonio Delfim Netto, "o Brasil importou a expectativa [de crise] antes da própria doença" e está pagando um "preço caro por algo que está mais para gripe do que para pneumonia". Para ele, não existe "a menor hipótese" hoje de saber precisamente como será o ano de 2009.
**Ana Maria Castelo, da FGV, diz que os dados indicam o começo de um ciclo vicioso na economia. "O problema é a profecia que se auto-realiza. A indústria produz menos diante de uma expectativa de queda de demanda. Mas não podemos nos esquecer de que, antes de começarmos a falar em crise, havia necessidade de desaceleração por conta da inflação".
**O otimismo do terceiro trimestre deu lugar à descrença. "A conjuntura mudou muito a partir de outubro. E mudou para pior", resume Bráulio Borges, economista da LCA
.


Vamos assumir a realidade, enfrentá-la, não nos entregarmos ao medo. Quando a economia estava a favor – impulsionada pela falsa grandeza econômica americana – todos nós deixamo-nos levar pela maré favorável e aproveitamos. Muitas empresas, que estão agora chorando, aproveitaram durante anos os ventos favoráveis e agora dizem não poder retrair, suplicam (chantageiam) ao governo por ajuda. Transferem à classe operaria o ônus.
Washington anunciou um plano de resgate de 700 bilhões de dólares para os bancos que foram os atores de Wall Street.
Também, para preservar empregos, anunciou mais tantos outros bilhões para o setor automobilístico.
Estamos agora endeusando Keynes e abominando os neoliberais - antes tarde do que nunca.
Estamos desde sempre nesta economia globalizada, a crise “não vem lá de fora”--- não existe “lá fora”.
Deng Xiaoping disse “Não importa a cor do gato, desde que apanhe o rato”.
Não importa o sistema econômico, importa sim é criar condições globais para uma sociedade não tão dispare.
E que seja agora, chega de geração sacrificada para a próxima obter benesses... Pois “o futuro ao morto não interessa”.







2008/12/17

Quantas mãos atiraram esse sapato?

Eu fiquei indignado
Ele ficou indignado
A massa indignada
Duro de tão indignado

A nossa indignação
É uma mosca sem asas
Não ultrapassa as janelas
De nossas casas


Samuel Rosa/Chico Amaral

2008/12/14

Noites com os Irmãos Coen, Michel Gondry e Hirokazu Kore-eda

Nesta semana fui ao cinema para ver mais um trabalho dos Irmãos Coen e vi um filme digno deles. É a comédia de humor negro “Queime depois de ler”, na qual quem vai para ver Brad Pitt ou George Clooney acaba sendo pego por John Malkovich. Fiquem atentos para não perderem o último diálogo entre Frances McDormanddo e seus interlocutores... só esse encerramento vale o ingresso.
Já na sexta fui assistir e me surpreendi com “Rebobine, por favor” onde Michel Gondry lança seu olhar sobre os anos 80 e a popularização da sétima arte através do VHS, a extinção das locadoras de bairro e a uma época em que a criatividade corria livre por Hollywood, quando estavam apenas começando as seqüências e refilmagens e a quase inexistência da computação gráfica forçava a indústria a buscar inventivas soluções para as cenas que desejava criar.
No sábado encerrei a noite assistindo o DVD “Depois da vida”, obra sensível onde em um ponto qualquer entre o céu e a terra, pessoas mortas recentemente são apresentadas aos seus guias que, durante os três dias seguintes, ajudarão os mortos a vasculhar suas memórias em busca de um momento determinado de suas vidas, um marco em suas existências. O momento escolhido será recriado em um filme, que será uma espécie de lembrança que levarão consigo em sua passagem para o paraíso, ou seja, escolher o momento mais importante de suas vidas, aquilo que deverá ser gravado para sempre e que servirá como o exemplo de suas vidas passadas.

2008/12/13

O momento do se reinventar.

Tenho vários amigos e amigas que estão passando pelo mesmo momento em que estou passando: o de ter uma filha escolhendo seu futuro, outra prestando faculdade para uma carreira escolhida na última hora, um filho procurando a primeira colocação no mercado de trabalho, uma filha procurando estágio, outro se descabelando com o TCC....
No final do ano que vem minha filha irá deixar o 3º colegial e para traz ficarão muitos amigos e muito da rotina atual da sua vida será mudado. As mudanças na vida de um jovem até essa fase são graduais e quase que imperceptíveis, vão ocorrendo paralelamente e semelhante aos seus pares.
Agora ela vai escolher um novo caminho.... se reinventar, se individualizar.
Não vamos exigir que eles dêem certo. O que é dar certo?
Vamos esquecer o gabarito nós dado para viver e deixá-los fazerem os seus.
Tem uma historia que diz que nos matam aos 18 e nos enterram depois dos 90 – aos 18 matam nossos sonhos, nos dão uma vida já pronta... é só seguir o gabarito.
Que os jovens se reinventem para serem felizes... para viverem uma vida que valha a pena ser vivida.
Uma vida feita e escolhida por eles.

2008/12/08

09/12/1980 - “...o sonho acabou, o que posso dizer? O sonho acabou, ontem.”

"The dream is over
What can I say?
The dream is over
Yesterday" God - John Lennon
09/12/1980
Já não era uma manhã normal, estava ansioso, tão ansioso quanto pode estar um jovem que acumulava dúvidas a cada despertar; que descobrira que o mundo é grande demais para caber em seus planos; que as verdades são relativas e as mentiras são muitas vezes apenas divergências das reflexões da mente, idéia que da “mente se tira”.
Descobrira que a cada passo que dava mais distante ficava daquilo que imaginava ser seu caminho que a cada pessoa que conhecia mais introspectivo ficava.
Manhã quente aquela, na qual se via como personagem do “Ultima sessão de cinema”, com aquele sentimento de incomodo por se sentir no primeiro dia de um devir incerto. Manhã quente aquela na qual se sentia como um apêndice em seu próprio meio e o seu meio, antes uma unidade indivisível, revelava-se agora um universo fadado ao fim por ter se tornado tão heterogêneo.
O sonho acabou – depois de dez anos essa frase se fez coerente. Estava na hora de acordar (bicho).
“O futuro é sempre maior do que o passado.
O futuro é sempre maior do que o passado.
O futuro é sempre maior do que o passado”.
Sentado pensava, como sempre pensava. Ele era do tipo que sonhava muito mais do que agia, um subproduto da geração dos anos 60.
Por ser de 62 era muito jovem para participar da geração “paz e amor”, tendo recebido de bandeja todas as benesses adquiridas com as conquistas dela. Estava em Portugal em 68, onde a poucos quilometros Cohn Bendit arrebatava Paris.
Jovens de todo o mundo se mobilizavam. Foram anos em que uma nova arma se pôs contra aqueles que queriam manter o status quo: a informação.
Nos anos 60 jovem era sinônimo de atitude, mudança, imposição, confronto. Foi a época do experimental, da inconseqüência produtiva, anos aos quais Manuel Castells creditou três processos independentes: revolução da tecnologia da informação, crise econômica do capitalismo e do estatismo e apogeu de movimentos culturais e sociais, tais como libertarismo, igualdade étnica, direitos humanos, feminismo e ambientalismo.
Como se pode ver, esses anos criaram muito mais do que a revolução sexual. Pode-se por em questão se a liberação sexual adveio da luta dessa geração ou se ela foi um instrumento. Fernando Gabeira diz que um dos pontos essenciais na possível relação dessa geração com o poder é o erotismo. Já Marcuse propunha uma transformação social que tivesse como objetivo a liberação das dimensões estético-eroticas das pessoas.
Seja como for, lutavam por mudanças, não pelo poder.
Na década de 70 aqueles jovens já não eram mais tão jovens e perderam a sua identidade, formaram famílias, conquistaram patrimônios e substituíram o “nós” pelo “eu”. Passaram a viver em conflito consigo mesmo.
E a contra cultura virou produto.
“Liberdade é uma calça velha, azul e desbotada”
Em 1970 aquele que se intitulara “herói da classe operária” avisara que o sonho tinha acabado, que agora era cada um por si de novo. Ao se ser acordado de maneira abrupta demora-se um pouco para despertar, para se ter noção de onde se está, e foi o que aconteceu com essa geração. Tiveram de aceitar a nova ordem e cada qual buscar o seu lugar na sociedade.
Agora a geração que viria não teria uma identidade a seguir; sem heróis, sem parâmetros. E foi nessa nova ordem que ele cresceu, numa década de muito papo cabeça, música cabeça, cigarro cabeça, cinema cabeça, rum e coca na cabeça.
“... os tempos da história não são os tempos de nossa fantasia.” - Fernando Gabeira.
Seus pensamentos foram interrompidos pela entrada abrupta de uma figura singular, o Regis – um Punk de butique, loiro, alto, magro, falante e boa gente – que entrou no vaticano trajando uma braçadeira negra (vaticano era a denominação dada a uma das salas do colégio Objetivo, por seu tamanho excessivo) e anunciou aquilo que no momento foi para todos o deslocamento da parede a qual durante anos muitos se mantiveram apoiados: a morte de John Lennon.
Rito de passagem, talvez esse tenha sido o dele. Gênese de outra pessoa. Ele que já havia, mesmo que inconscientemente, derrubado seus ídolos, largado as utopias, agora se via livre da ancora que se faz ser a figura de um ícone aos olhos de um jovem.
Não era mais aquela pessoa que acreditava que o mundo tinha concerto, que tinha amigos especiais, que nada iria macular seus conceitos.
Iconoclasta que era assassinou um por um seus heróis, não sem antes tê-los ingerido, mastigado e digerido.
É nesse ponto da vida em que se tem coragem, ou não, para enxergar os defeitos do seu progenitor – o que te levar a conjecturar que se é derivado de algo imperfeito, imperfeito se é -; quando se vê capaz de derrubar do altar a santa da sua mãe ao perceber os atos egoístas e manipuladores de toda mãe e quando o Deus todo poderoso não lhe parece mais capaz de resolver os problemas humanos.
Chapman deu cinco tiros no mito e extinguiu a inocência. Matou o último emblema verossímil para uma facção de teimosos sonhadores.
A morte aumenta o ídolo. Para ele, que tinha ciência de toda pequenez humana de John, a morte não o fez vê-lo diferente.
John era realmente mais popular que Jesus e ao ser crucificado apenas passou a ser um produto ainda mais lucrativo.
"Viver é melhor que sonhar" .
O sonho acabou, o que posso dizer? O sonho acabou, ontem....